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Bem-vindo/a ao DIÁRIO DIGITAL DOS OFICIAIS DE JUSTIÇA DE PORTUGAL publicação periódica independente com 11 ANOS de publicações DIÁRIAS especialmente dirigidas aos Oficiais de Justiça
O procurador coordenador da Comarca de Lisboa, José António Branco, em entrevista ao Diário de Notícias, ontem publicada, refere que a má imagem da justiça se deve a "erros de comunicação".
Para este procurador, que exerce as funções de coordenação dos serviços do Ministério Público na Comarca de Lisboa, não há problemas relevantes na Comarca, bem pelo contrário, tudo corre normalmente e de forma adequada, justificando com os tais erros de comunicação e os dados estatísticos.
O procurador cai novamente no erro dos números que têm servido de bandeira a tantas públicas afirmações de que tudo está bem no sistema de justiça, afirmando o já habitual sucesso estatístico com a diminuição de processos pendentes como se isso significasse uma maior e melhor atuação dos serviços.
Já aqui o afirmamos inúmeras vezes: a diminuição das pendências ocorre pela celeridade imposta nesse sentido. Hoje temos como objetivo principal na justiça obter estatísticas fantásticas, obrigando todos os intervenientes a trabalhar para tal fim. No Ministério Público, os despachos de arquivamento, sem o mínimo esforço de averiguação, sucedem-se diariamente, tornando inúteis os esforços das polícias e dos cidadãos com tantas participações que não são consideradas sob nenhum aspeto, sendo liminarmente arquivadas como se nunca tivessem existido.
A par desta atuação, que se quer rápida para ser considerada brilhante, temos a diminuição de entrada de processos.
Cada vez há menos processos a entrar nos tribunais e nos serviços do Ministério Público, não só pelos elevados custos que a justiça impõe aos cidadãos, como pela constatação da inutilidade da apresentação de participações que resultam sempre em nada e em arquivamentos massivos. Os serviços do Ministério Público deste país têm imenso trabalho, é verdade, mas tal trabalho prende-se essencialmente com os massivos arquivamentos.
Hoje em dia, qualquer cidadão deste país sabe que qualquer relacionamento que possa vir a ter com o sistema judicial lhe vai aportar transtornos diversos, como idas aos tribunais e aos serviços do Ministério Público, ameaças de multas caso se esqueça ou tenha algum contratempo, a possibilidade de ter a polícia à sua porta, o custo com taxas de justiça e demais custas processuais e, bem assim, os honorários dos advogados. Por isso, todos os cidadãos deste país preferem fugir do sistema judicial, sempre que tal seja possível.
As vítimas de crimes, não querendo ser vítimas duas vezes – pelo crime em si e depois pela máquina judiciária –, preferem não apresentar queixa ou desistir das queixas, ou não falar, etc. Ou seja, preferem tudo menos ter que lidar com uma justiça que consideram má e que lhes aporta prejuízos sucessivos e não acautela devidamente os seus direitos.
O procurador coordenador da Comarca de Lisboa diz que estes cidadãos padecem apenas de "erros de comunicação" e não dos padecimentos reais que diariamente se constatam com todos os cidadãos a tentar fugir das malhas da justiça e não são apenas os criminosos ou os indiciariamente criminosos, são os próprios queixosos; as vítimas. Ninguém quer nada com a justiça e por isso cada vez há menos processos a entrarem e, por isso, embora haja falta de pessoal, como os processos vêm diminuindo, conseguem-se finalizar os que vão ficando.
Isto não significa que haja uma maior eficácia mas apenas uma maior disponibilidade.
Aliás, se houvesse mesmo, como se alega, uma maior eficácia, tendo em conta a diminuição das entradas, então, esta maior eficácia, com menos processos a entrar, a taxa de resolução de processos não poderia ser de cento e pico por cento mas de duzentos por cento, mas não é, e não é porque não há maior eficácia, aliás, nem sequer há uma estabilização da eficácia, há, antes, uma perda de eficácia, uma vez que a taxa de resolução de processos não acompanha de forma proporcional a descida das entradas; o que significa uma redução da eficácia.
Para além disso, acresce que os registos de entradas de processos, especialmente no Ministério Público, estão hoje mais inflacionados do que estavam há uns anos atrás, uma vez que muitos dos papéis que hoje dão origem a processos registados como tal, com duas ou três folhas e uma delas é a capa e outra o despacho de arquivamento, antes nem sequer eram registadas como processos, sendo tramitados fora desse registo.
Assim, temos hoje um Ministério Público que regista como processo tudo o que lhe aparece à frente, quando antes tal não sucedia, o que dá números de entradas maiores mas que, ainda assim, são menores. Por outro lado, a recente cultura de adoração dos dados estatísticos e dos objetivos quantitativos, aportam um serviço que se afasta das pessoas e isso é um mau serviço e isso é o que se lê nos números estatísticos quando interpretados na sua globalidade e não apenas nas percentagens finais de resolução processual.
Para quem ainda não percebeu isto vejamos um exemplo:
Se num determinado período em análise entrarem 50 processos e terminaram 60, isto quer dizer que se conseguiu terminar com uma quantidade idêntica aos entrados e ainda se foi aos que estavam pendentes, acabando-se com mais. Ora, isto, em termos percentuais, resulta numa taxa de resolução processual de 120%. Excelente taxa, acima dos 100%, nítida recuperação das pendências que cada vez são, necessariamente, menores.
Vejamos agora a seguinte situação: no mesmo período em análise, em vez dos 50 novos processos, afinal entraram menos, apenas 40 e terminaram também menos, apenas 50 (em vez dos 60). Perante esta situação é nítida a diminuição das entradas, o que, obviamente, representa menos trabalho e mais disponibilidade para acabar mais processos, no entanto, nem sequer se verifica que essa disponibilidade tenha contribuído para acabar mais processos porque até acabaram menos.
Com estes números vemos como os serviços estão menos eficazes; como as entradas diminuem e, ainda assim, não há uma maior eficácia, pois se para os tais 50, do primeiro caso, terminavam 60, agora com a entrada de 40 apenas terminam 50. Há uma nítida diminuição de eficácia, uma vez que, seria expectável que a uma maior disponibilidade correspondesse uma maior eficácia, esperando-se que terminassem não os 50 e nem sequer os 60 mas mais ainda: 70 por exemplo, mas tal não sucede, porque em vez dos 70 foram apenas 40.
Neste último caso aqui dado como exemplo, as administrações da justiça (central e locais) veem êxito, porque se limitam a ver o diferencial entre os acabados e os entrados e como os que acabam são mais que os novos, então há êxito e ainda porque vão achar uma percentagem e, atenção, para este segundo caso, a taxa de resolução processual é de 125%, isto é, é ainda maior que os 120% do primeiro caso.
Assim, tendo um número mais alto de processos terminados e uma taxa ainda mais alta, as administrações da justiça consideram que está tudo impecável e cada vez melhor e, pior ainda, são capazes de transmitir essa informação aos jornalistas e, pior ainda também, como não temos jornalistas que saibam fazer contas e que saibam ser jornalistas de facto, limitam-se a reproduzir de forma acrítica tudo aquilo que lhes é transmitido, ofertado, sem esforço, e ainda embelezado com uma lindo laço de "erros de comunicação", a mensagem passa incólume.
Não há erros de comunicação, há, antes, erros de computação dos dados e erros de interpretação dos mesmos.
Perante dados que correspondem ao segundo caso aqui dado como exemplo, o procurador coordenador da Comarca de Lisboa refere que "tais resultados seriam suficientes para projetar uma imagem basicamente positiva em qualquer circunstância". Pois seria, tem toda a razão, mas seria se tais dados tivessem alguma conexão com a realidade e com a vivência dos cidadãos, o que não ocorre, pelo que tal projeção de imagem "basicamente positiva", como diz, não pode ocorrer, tão basicamente por isto: porque não existe.
Mas na entrevista surge ainda uma verdadeira pérola estatística e justificativa, que é quando o procurador coordenador da Comarca de Lisboa compara a confiança dos portugueses na justiça com países como a China, o Usbequistão, o Azerbaijão e outros, assim justificando que o nível de confiança dos portugueses na justiça é bom.
A sério que o disse e disse assim:
«A percentagem de desconfiança é entre a imensa maioria dos cidadãos, que rondam os 75% ou mais, que nunca tiveram contacto com o sistema. Verdadeiramente onde os índices de confiança são acima dos 80% é noutras latitudes, como a China, Usbequistão, Azerbaijão e outros.»
Mas não se ficou por aqui, há mais.
À pergunta do jornalista: "Segundo o memorando que publicou, os casos de violência doméstica são maioritariamente arquivados. Como explica isso?"
A resposta do mesmo procurador coordenador foi assim:
"A desproporção existe mas pode ser enganosa, uma vez que o MP acusou em 18% dos casos".
Isto quer dizer o quê? Quer isto dizer que 82% dos casos foi arquivado? Segundo o procurador não, "a desproporção existe mas pode ser enganosa". Enganosa? Onde? Mas é ou não é verdade que a esmagadora maioria dos casos foi arquivada?
Segundo o procurador não, porque a taxa de 18% de acusações é muito boa, tendo em conta que a taxa de acusações para a criminalidade geral é inferior em 2,5%.
Como? Sim, diz mesmo isso: "resultado superior ao atingido na criminalidade em geral, em cerca de 2,5%". Isto é, considera o procurador que sendo a taxa superior à da criminalidade geral, já está tudo bem, quando é precisamente o contrário, está tudo mal: não só detém uma taxa para a criminalidade geral de cerca de 15%, isto é de 85% de arquivamentos, como detém percentagens igualmente muito baixas para a violência doméstica. Ou seja, a eficácia do Ministério Público é enorme e muito boa mas é nos arquivamentos, é aqui que o Ministério Público hoje obtém grande sucesso e satisfação.
Para além de tudo isso, ainda conclui que a culpa pela falta de mais acusações reside no facto das vítimas preferirem ficar caladas. Isto é, a culpa é das vítimas e não do Ministério Público que não é capaz de fazer mais quando alguém, legitimamente, por medo, se cala.
O alegado “erro de comunicação” reside na falta de compreensão de que o Ministério Público tem que ter um papel ativo, e não passivo, e que para tal papel ativo, tem que perder tempo com os casos que lhe são apresentados, ainda que não lhe sejam apresentados com a “papinha toda feita”.
O Ministério Público, quando arquiva mais de 80% dos casos que lhe são apresentados está de facto a ter um “erro na comunicação” mas tal erro é interno, na falta de compreensão do seu papel no seio do Estado de Direito.
Não consta em lado algum que a função principal do Ministério Público seja o de arquivar processos. É indecoroso que se diga, ainda por cima publicamente, que se arquivam mais de 80% dos processos e que está tudo bem, porque as pessoas não falam e não compreendem a comunicação, porque não estamos na China, no Usbequistão nem no Azerbaijão.
O mesmo Diário de Notícias que publica a entrevista, publica também um artigo de opinião do seu diretor adjunto, Paulo Tavares, que opina sobre a entrevista nos seguintes termos:
«A entrevista do magistrado do Ministério Público (MP), José António Branco, nesta edição do DN, é reveladora de como a justiça é vista por dentro. Pelo menos por uma parte essencial dos seus operadores. Afinal, lendo as respostas às questões da jornalista Filipa Ambrósio de Sousa, tudo está bem. Há um ligeiro atraso nos processos de corrupção, que nem é da responsabilidade direta da sua comarca, mas tudo está bem. São quatro anos de espera, mas está tudo bem. Tudo estará bem, presume-se, para quem acusa, certamente não para quem é investigado.
É sobretudo esclarecedor ver a forma como este representante do MP trata as fugas ao segredo de justiça. É revelador que José António Branco considere absolutamente normal que terceiros se constituam assistentes no processo. Conhecemos bem os casos em que jornalistas se constituíram assistentes, passámos a conhecê-los em detalhe através das páginas de jornais e revistas. Sem contraditório, tendo acesso apenas a um dos lados da questão e sem qualquer respeito pela presunção de inocência. Este magistrado classifica esses casos – só poderá estar a falar deles já que está a responder a uma questão sobre fugas ao segredo de justiça e elas não acontecem nos tais 99% dos inquéritos "abertos", nem em processos sem qualquer relevância mediática – como "terceiros com interesse legítimo no processo". Nem por um segundo, nem numa linha de resposta, é questionado o conflito entre esse interesse legítimo na publicidade de casos mediáticos e outra fronteira de interesse, a do direito ao bom nome e à presunção de inocência de quem ainda está em fase de investigação, sem sequer ter visto deduzida uma acusação.
Bem sei que vou ser acusado de praticar o "politicamente correto", de estar ao serviço de este ou daquele interesse, mas o que sei é que não quero os meus filhos a crescer num Estado de direito que não consegue fazer respeitar um dos seus pilares fundacionais. Que esta questão não preocupe minimamente os principais agentes do sistema e que não esteja na agenda de partidos e de responsáveis políticos é igualmente preocupante. Por fim, espanta a tranquilidade com que nesta entrevista são comparados os fraquíssimos níveis de confiança na justiça em Portugal com "outras latitudes" onde essa confiança anda acima dos 80% – China, Usbequistão ou Azerbaijão. Quanto à qualidade do argumento, estamos conversados. Em suma, tudo está bem com a justiça em Portugal e se há algo de errado é devido a "erros de comunicação". Sim, há demasiados erros, não sei é se concordamos na definição de "comunicação".»
Pode aceder à entrevista aqui mencionada e com alguns extratos pontuais transcritos, bem como ao artigo de opinião aqui reproduzido, seguindo as hiperligações contidas.
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